Meio Ambiente e Construção

Língua de vaca: indicadora solos compactados e úmidos. Daninha?

 

Notícia de 12/8/2015

 

Mais do que errado, o termo ervas daninhas é preconceituoso e baseado numa visão utilitarista. Repare, o termo daninhas já indica que elas são prejudiciais, perniciosas, que causam dano. Mas… elas causam mesmo? Na natureza não existe nada que cause dano. Felizmente, só podemos falar de bem e mal, um discurso que envolve a moral, para questões humanas, e plantas são vegetais. Nem bons nem maus. Nunca daninhos, danosos. Só a partir desse raciocínio, o termo “erva daninha” já começa a parecer errado. 

Bom, nomes não surgem do nada, é preciso que alguém os crie. Talvez o agricultor que não sabia que elas tinham utilidade, ou o paisagista obcecado com uma grama impecável as percebe esteticamente daninhas Afinal, daninhas para quem? Talvez pro grande dono de terras que trabalha pra agroindústria – e me recuso a chamá-lo de agricultor, porque ele não trabalha com a terra, ele a explora. E a natureza não gosta muito de ser explorada, já perceberam? 

Primeiro, vamos às definições. Esse blog é chamado Matos de Comer não por acaso. Caso não tenha percebido, apesar de algumas frutas e receitas soltas por aqui, gostamos e falamos mesmo é sobre plantas ruderais, das quais muitas são plantas alimentícias não convencionais.

Plantas ruderais, caso tenha esquecido, é um termo eu te ajudo a lembrar: o termo é sinônimo de ervas daninhas, mas sem esse juízo de valores em cima delas. Ruderal significa “planta que acompanha o homem”. Ou seja, onde o homem vai e desmata, queima, corta, lá vem as plantas ruderais para ocupar o solo. As plantas espontâneas, que nascem sozinhas.

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Daninha e com orgulho!

 

Essas plantas tem a habilidade de deixar o ambiente sempre mais fértil, mais solto, mais úmido e mais rico em vida. Sempre. São aquelas que nascem onde nada mais nasce, e vão preparando terreno até que as plantas mais sensíveis possam nascer, seguidas de plantas maiores, até a reposição da vegetação.

Dessa forma, dificilmente você verá as espécies ruderais, “daninhas”, numa floresta com solo rico e fértil. Ali, elas não tem mais trabalho a fazer. Aliás, há sementes que ficam décadas no solo esperando o solo ficar compactado, seco, pobre ou raso para brotarem. É o plano de saúde do solo. A esse “plano de saúde” natural damos o nome de banco de sementes do solo. Se a terra fica doente, essas sementinhas entram em ação. 
 
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É só a terra ficar exposta que elas aparecem

 

E não, não estou inventando nada disso. Aliás, há muito de científico nisso, tanto que a grande Ana Primavesi já escreveu sobre isso, e é possível encontrar informações sobre isso até mesmo no site da Embrapa.

Aí está a mágica! Certas planta tem essa função na natureza, a de equilibrar, reestabelecer. Por exemplo, se o solo está muito compacto, a tendência é que nasçam plantas de raízes longas e profundas. Elas naturalmente descompactam o solo e o deixam fofinho e permitem a entrada de água. Inteligência da natureza?

Isso acontece porque as plantas de raízes rasas e fracas não conseguem penetrar a terra, portanto, as com raízes profundas e fortes prosperam. Por exemplo, espécies não comestíveis como a vassourinha de botão e a guanxuma são terríveis de arrancar, porque a raiz vai fundo na terra. Quando a planta morre, essas raízes viram túneis onde a água e a fertilidade penetram. E a terra vai afofando, afofando.  

Tomei a liberdade pegar o que já foi escrito sobre o tema e fazer uma tabelinha sobre as PANC e o como elas podem dar pistas sobre como está o solo da sua casa, praça, vaso ou quintal.

 

PB - Tabela

 

Se o solo, por sua vez, é rico em nitrogênio e pobre em outros nutriente, plantas que toleram esses altos teores crescem rapidamente. Isso explica, por exemplo, a presença de picão e guasca em locais que se joga água de reúso, beira de calçada e até perto de ralos – porque são ambientes ricos nesse nutriente, que será reciclado por essas plantas. Calçadas onde cachorro faz xixi, rico em nitrogênio, também são infestados por essas plantinhas.

A tiririca gosta de solos ácidos, adensados e compactos, e ela vai crescendo até que o solo fique mais solto e fofo. Depois que ele melhora, ela gradativamente vai sumindo, morrendo. Dificilmente você vê um solo de floresta rico em tiririca, porém, um canteiro sujeito a pisoteio estará cheio delas.

Ainda, um lindo campo de tagetes indica forte presença de nematóides, pequenos vermes do solo que danificam as raízes das outras plantas. A tagete é repelente dessas criaturas, e é a única que sobrevive num campo infestado. Com o passar do tempo, os nematóides são afastados pela tagete e outras espécies conseguem nascer na área.

Guilherme Ranieri 

 

Fonte: Blog Matos de Comer