Notícia de 1/7/2015
É comum ouvirmos gente proferindo sentenças apocalípticas do tipo “a construção civil desperdiça um prédio a cada três prédios que são construídos”, ou teorizando que “numa obra compra-se tudo 10% a mais por causa das perdas” etc. Sem querer entrar no rigor técnico de derrubar essas falácias do dia-a-dia, nosso enfoque esta semana é sobre as perdas que inevitavelmente ocorrem nas obras.
O conceito de perda é bastante abrangente. Para um leigo, perda equivale a desperdício, a resíduo que pode ser descartado ao final da operação. Esta definição é a que prevalece na cabeça de muitas pessoas, porque se baseia em um conceito visual. É como se perda fosse sinônimo de entulho.
Em nosso meio técnico, contudo, a definição de perda precisa levar em conta o conceito de bem de produção. Uma perda ocorre quando se utiliza uma quantidade maior de que a necessária de um dado insumo. Ela é toda quantidade de insumo consumida além da quantidade teoricamente necessária (calculada a partir do projeto ou de informações do fabricante). É um conceito econômico, que tem a ver com eficiência.
Por essa razão, perdas ocorrem não somente com materiais, mas também com mão de obra e equipamento.
Perdas de material
As perdas de material são as mais fáceis de se visualizar porque muitas vezes deixam rastro: o entulho gerado no emboço de uma parede, pedaços de blocos quebrados, tocos de barras de aço, sobras de madeira e areia que se mistura ao solo da obra. E há também os furtos.
Entretanto, há um tipo de perda que “come” dinheiro sem deixar resíduos. É a chamada perda incorporada. É o caso de peças de concreto moldadas com dimensões maiores do que as especificadas no projeto. Basta pensar numa laje projetada para ter 10 cm de espessura, mas que é concretada com 11 cm. Embora ao final da concretagem nenhum desperdício seja visível, essa laje consumiu 10% mais concreto do que deveria ter consumido (esse mesmo centímetro adicional representaria 25% a mais em uma laje de oito cm!).
Mas de onde surgem esses desvios de espessura? Do controle deficiente em campo. A ausência de tirantes intermediários na fôrma de um pilar longo, por exemplo, pode causar o “embarrigamento” da fôrma, com consequente aumento do volume de concreto para preencher o espaço. O leitor já viu parede fora de prumo? Eu já. E o pior é que quando o engenheiro se dá conta disso, o pedreiro vem a famosa frase que me dá náuseas: “na massa a gente tira”. Ora, ele pode até estar se esforçando para corrigir o defeito do levante da parede, mas certamente ninguém orçou o consumo de argamassa com essa espessura toda…
Como se minimizam essas perdas? Melhorando treinamento, aprendendo com lições de outras obras, aprimorando o controle da qualidade no campo e fazendo conta. Paginação de paredes, distribuição de materiais em paletes, estocagem correta e transporte interno em equipamentos adequados (há sempre um tijolinho que teima em cair do carrinho de mão…) são apenas algumas boas práticas que podem amenizar as perdas.
A simples divisão da quantidade efetivamente consumida pela quantidade teórica revela o percentual de perdas. O importante é não ficar chorando sobre o leite derramado, e sim evitar que o leite derrame na operação seguinte.
Perdas de mão de obra
As perdas de mão de obra estão diretamente associadas à gestão da produção. O engenheiro pode ter um papel decisivo no controle dessa perda que não é tão imediatamente detectada.
Uma manifestação de perda de mão de obra mais visível é a ociosidade, ou seja, os momentos em que o operário não está agindo produtivamente. Muita ociosidade facilmente observável representa quase sempre uma equipe inchada de ajudantes. Pode-se tentar transferir 1 ou 2 deles para outras frentes e observar se a produtividade do oficial (pedreiro, carpinteiro, armador, eletricista) se mantém no mesmo patamar. Esta é até uma forma de aferir se a composição de custos do orçamento estava bem calibrada.
Outro fator de consumo anormal de horas se dá quando há falta de material. Esse é um erro crasso de produção/suprimento. Basta imaginar o custo de uma equipe de 6-8 pessoas sentadas no chão aguardando argamassa ou azulejo no 10º andar de um edifício. Quem paga isso?
Mas há também o desperdício oculto. Uma praça de trabalho em que todo mundo está ocupado não necessariamente significa uma praça de trabalho ideal. Pode ser que muitos desses trabalhadores estejam empenhados em deslocamentos necessários, seja porque o ponto de descarga e armazenamento ficam muito distantes, ou a logística interna está ruim, por exemplo. Lembre-se de que rever periodicamente o arranjo do canteiro pode reduzir distâncias.
Outra fonte de perda de hora é a localização de sanitários, refeitórios e relógio de ponto. Vale a pena dedicar algum tempo a melhorar a posição desses elementos no canteiro de obras.
Perdas de equipamento
As perdas de equipamento são similares às de mão de obra. A manifestação mais comum são as esperas de caminhão na fila da escavadeira ou da carregadeira, porém ocorre também o inverso: escavadeira/carregadeira esperando caminhões. Isso tem origem no dimensionamento incorreto da proporção entre os equipamentos, seja porque o tempo de ciclo foi mal calculado, seja porque caminhões estão atendendo simultaneamente a mais de um equipamento de carga e estão sendo mal orientados pelos encarregados.
No caso de um guindaste, por exemplo, há perda inevitável em dias de fortes ventos, quando o guindaste obrigatoriamente tem que ficar parado.
Perdas financeiras
As perdas financeiras surgem de estratégias comerciais equivocadas. A primeira delas é manter altos volumes de bens em estoque. Estoque cheio não é sinal de boa providência, é sinal de má gestão de compras, porque significa que houve comprometimento de dinheiro antes da obra, privando a construtora de recursos para outros negócios, investimentos, aplicações bancárias, etc. (Já ouviu falar da técnica Just in Time? Ela preconiza que o ideal é que o fornecedor entregue a mercadoria justamente na hora da aplicação, praticamente zerando os estoques).
Outro erro advém de compras a menor. Quando o construtor se dá conta de que é necessário fazer um pedido complementar, via de regra este segundo pedido tem preço unitário mais caro.
Indicadores
O que realmente é necessário nas obras é que alguém se encarregue de criar um sistema de indicadores que forneça uma métrica confiável de aferição de desempenho. Lembre-se: não se consegue gerenciar aquilo que não se consegue medir.
Eleja os principais insumos e serviços de sua obra e componha o sistema de indicadores e a metodologia de coleta de dados. Com algumas planilhas e idas frequentes ao campo e ao almoxarifado, um engenheiro consegue montar esse plano de controle.
O importante é que esse sistema contenha os seguintes elementos:
Um bom livro é “Como reduzir perdas nos canteiros”, de Ubiraci Espinelli Lemes de Souza
Fonte: Pini Blogs