Meio Ambiente e Construção

Notícia de 11/3/2020 

 

Se pensarmos em uma cidade como um organismo vivo, o que podemos aprender da natureza sobre como gerenciar um sistema tão complexo? Podemos aplicar ideias da biologia para construir cidades melhores e mais sustentáveis? E se sim – quais poderiam ser essas ideias?

O emocionante campo do bio-urbanismo tenta responder a essas perguntas explorando a interseção entre as cidades e o mundo natural ao nosso redor.

Historicamente, as cidades começaram como o oposto da vida rural. Para acomodar um grande número de pessoas em um território limitado, elas tiveram que desistir das florestas e terras agrícolas e priorizar a alta densidade em relação à higiene, aos acessos a recursos limpos ou à saúde mental. Fora da fronteira da cidade, a natureza era de suprimento ilimitado, mas dentro tornou-se uma mercadoria rara – amplos parques e jardins tornaram-se um luxo, um símbolo de prosperidade e bem-estar.

Mas nem todos consideravam isso, e muitos grandes pensadores desafiaram a dicotomia tradicional entre urbano e rural. Em 1898, Ebenezer Howard desenvolveu o conceito de uma “cidade-jardim” que combina residências, indústria e agricultura, cercadas por cinturões verdes. Em 1977, Christopher Alexander escreveu em seu famoso livro: “Quando o campo está longe, a cidade se torna uma prisão”, e sugeriu entrelaçar zonas rurais e terras urbanas em toda a cidade. A ideia de que a vibração e as oportunidades da vida urbana podem ser combinadas com os benefícios dos recursos naturais limpos tornou-se uma das pedras angulares do urbanismo.

 

 

No entanto, no passado, isso era principalmente filosofia – e hoje podemos realmente quantificar seu impacto e transformá-lo em uma ciência. De fato, há um corpo emergente de pesquisa mostrando como a natureza contribui enormemente para nosso melhor bem-estar físico e mental, adaptação e mitigação das mudanças climáticas e a sustentabilidade do planeta a longo prazo. Com base nessas ideias, cidades de todo o mundo começam a adotar políticas verdes para apoiar o bioma urbano – na medida em que a Nova Agenda Urbana, uma declaração global de “cidades para todos” da ONU, pede ações exatamente sobre isso.

Não apenas aprendemos a medir os benefícios de um ambiente verde – também aprendemos a entender a própria natureza muito melhor. Juntamente com o desenvolvimento da biociência e da tecnologia, começamos a ouvir o que a natureza tem a nos ensinar e a procurar maneiras de desvendar todo o seu potencial. Não era mais apenas uma ferramenta, mas uma enorme fonte de conhecimento e inspiração, abrindo caminho para o novo campo do bio-urbanismo. Ao longo de milhões de anos, a natureza alcançou um equilíbrio harmonioso, tudo sob condições adversas e com recursos limitados. Então, como isso aconteceu? Podemos aplicar os mesmos métodos para tornar o habitat humano mais habitável?

 

 

A maneira mais direta de replicar o sucesso da natureza é a biomimética: uma abordagem de design para o desenvolvimento de novas soluções que imita os sistemas e elementos encontrados no mundo natural. Agora que entendemos melhor a ciência da vida, podemos realmente tirar dela inspiração e alavancar sua genialidade. Desde a criação de energia eólica eficiente, a aprendizagem com as baleias jubarte, até o design de edifícios sustentáveis imitando o habitat dos cupins, a biomimética nos permite aplicar inteligência biológica a campos que antes pareciam completamente sem relação: arquitetura, design urbano, economia e sociologia.

 

 

Outra abordagem é a da integração, como o uso da biotecnologia. Com uma quantidade crescente de projetos de pesquisa e design focados na interseção entre ambientes naturais e construídos, encontramos novas maneiras de trabalhar com a natureza e aprimorá-la, e não apenas aprender com ela. Neri Oxman, do MIT, dirige o grupo de pesquisa Mediated Matter, que usa ideias de design computacional, fabricação digital, ciência de materiais e biologia sintética para inventar algumas soluções surpreendentes. Um de seus projetos, o Pavilhão da Seda, é uma estrutura arquitetônica construída por… bichos-da-seda! Milhares de lagartas, colocadas na estrutura com a ajuda de um braço robótico programado, atuam como uma impressora biológica, preenchendo as lacunas com fibras de seda; uma bela colaboração da tecnologia humana e da natureza trabalhando em conjunto.

 

 

Da mesma forma – embora ainda tenhamos muito a aprender antes de “cultivar” edifícios – podemos usar nosso entendimento atual da natureza para revolucionar a maneira como pensamos em design e construção, desenvolvendo soluções baseadas na natureza. Por exemplo, em 2014, a The Living, com sede em Nova York, colaborou com a Ecovative Design, uma empresa que produz tijolos de micélio para substituir o plástico; juntos, eles construíram uma torre de 13 metros de altura no pátio do MoMA. Por alguns meses, sediou eventos públicos – e depois foi desmontada e compostada, com o solo resultante usado nas hortas comunitárias locais. Existem muitos componentes biológicos que podemos usar para inovar, como o desenvolvimento de novos materiais ou a geração de energia.

 

 

Este é apenas um vislumbre do futuro que podemos construir, onde as cidades coexistem com a natureza em uma simbiose perfeita. As ideias da biociência podem nos ajudar a moldar um amanhã melhor, não apenas transformando o mundo material ao nosso redor, mas também mudando os paradigmas sociais, culturais e econômicos. Existem muitos outros conceitos a serem explorados – do design biofílico à economia circular – que estão mudando a maneira como pensamos sobre as cidades. 

 

Fonte: Archdaily