
Artigo de 14/12/2010
Casa segura é casa de tijolo, como diria o irmão mais velho no famoso conto infantil - a história dos 3 porquinhos. Pode até ser, mas o que anda sendo questionado pelo pessoal da bioarquitetura tem a ver com a opção do primeiro porquinho: construir uma casa de palha. Já ouviu falar em straw bale? Há diversas experiências com essa técnica, especialmente na Europa, que mostram que erguer casas de palha é não somente seguro como também ecológico e termicamente muito eficiente.
A diferença está na técnica, mais apurada, digamos assim, do que a usada pelo personagem que teve a casa assoprada por um lobo. A palha (em geral de trigo, aveia, arroz ou centeio) é usada em fardos como se fossem grandes tijolos e funciona como elemento estruturante da casa. Os fardos empilhados devem ser amarrados (com bambu, madeira, ferro ou outro material) e, depois de erguida a parede, recebem um revestimento que leva terra crua, areia, água e cal alguns mais céticos acrescentam também um pouco de cimento.
O resultado são casas com paredes largas, com uma espécie de colchão de ar entre as fibras, condição que impede a entrada rápida de frio e calor, o que significa dizer que elas proporcionam mais conforto térmico: são mais frescas no verão e quentinhas no inverno. Além disso, têm ainda a vantagem da construção mais rápida, já que os fardos, por serem grandes, aceleram o andamento da obra cada fardo deve valer, numa estimativa rápida, por mais ou menos uns dez tijolos assentados.
É estranho imaginar que em tempos de edifícios de aço, dry wall e concreto (muito concreto), possa existir alguém interessado em usar materiais tão rústicos e primitivos. Mas esse tipo de gente cresce mais e mais a cada dia e há evidências que mostram que eles são menos loucos do que você imagina. Eu mesma já visitei uma casa de palha, na ecovila de Findhorn, Escócia. Fazia muito frio e ela estava bem confortável, isso posso garantir. Além do mais, tem muita gente pesquisando alternativas para tornar a construção civil menos pesada para o planeta. Você sabia que o setor sozinho consome 40% de todas as matérias-primas extraídas do planeta? E que também gasta 40% da energia gerada em todo o globo? Já ouviu falar que a indústria cimenteira responde por 5% das emissões mundiais de CO2? Pois é, está mais do que na hora de repensarmos a tal casa de tijolinho…
Nas construções com palha, a estratégia fundamental é construir uma base que proteja a palha da umidade (pode ser um alicerce de pedras, por exemplo) e um bom beiral de telhado, que faça o mesmo com a chuva e o sol. Essa dica, aliás, vale para toda obra feita com materiais naturais, orgânicos por natureza, que precisam ser poupados das intempéries para que continuem firmes e fortes e à prova de lobos malvados.
Aqui no Brasil, a arquiteta Letícia Achcar pesquisa técnicas de construção com terra crua há anos. Em uma de suas investidas, ela criou o que chama de tijolo de terra-palha, um tipo de bloco que leva o que o nome sugere: uma mistura de terra (de preferência, extraída do terreno onde será erguida a casa) e palha. Em seu escritório e loja com um show room de materiais ecológicos, a Primamatéria, em São Paulo, ela expõe sua criação como uma das possibilidades de construção mais sustentável.
Na Ecovila Clareando, da qual faço parte, conseguir domesticar a técnica e construir com palha de braquiária (tipo de capim comum em pastagens) seria simplesmente maravilhoso. Isso porque a comunidade fica numa área que já foi um pasto de criação de gado, e até hoje a braquiária está em todo lugar em que não plantamos pomares ou mudas de árvores para recompor a floresta nativa. Em outras palavras, braquiária e terra são os materiais mais abundantes na ecovila e usá-los para levantar nossas casas e construções coletivas seria econômico, ecológico e inteligente. Falta agora um pouco de persistência e espírito pioneiro para convencer a comunidade de que ao porquinho da casa de palha faltou apenas um pouco mais de técnica …
Giuliana Capello - jornalista
Fonte: Planeta Sustentável